
Chorão
de 16/10 a 06/11 de 2017
504 vídeos
série Chuá
aarea.co
Confrontada com o convite de desenvolver um trabalho de ininterrupta exposição ao longo de 21 dias – diferentemente de uma exposição “física”, que supõe um período restrito ao público e cujo o horário é, portanto, fracionado -, Flora Leite se propôs a pensar em todas as 504 horas de duração do trabalho, de modo que o espectador, ao entrar no site, sempre se depare com uma nova versão da proposição, mesmo que o vídeo apresentado seja um loop da mesma imagem.
Para dar conta do calendário, o trabalho “Chorão” consiste em uma filmagem de quatro peixes artificiais fixados em uma vitrine de cortina d’água de uma loja de aquário. A tomada de câmera parte do ambiente interno em direção ao exterior; o plano é fechado, permitindo entrever poucos detalhes da rua ao fundo. O mesmo plano foi filmado dia e noite pela artista e, a partir dessas duas variáveis referentes à luz, Flora aplica outras cinco para acionar a imagem. São elas:
A – frente/reverso (2 variantes)
B – looping com efeito/sem efeito (2 variantes)
C – som ambiente/silêncio/música (3 variantes)
D – qualidade de compressão do vídeo: ruim, média, boa (3 variantes)
E – velocidade: 5%, 10%, 15%, 25%, 50%, 75%, 100% (7 variantes)
A matemática de combinação entre esses fatores (2 x 2 x 2 x 3 x 3 x 7) resulta em 504 variantes correspondentes ao número de horas do trabalho no ar). O trabalho inclui um painel localizado logo abaixo do vídeo, anunciando o conjunto de fatores aos quais o vídeo da vez está submetido. Diante de tais operações, que remetem de maneira mambembe aos efeitos especiais de pós-produção utilizados em filmes comerciais, Flora induz variações na cena estática de um aquário que simula ação, ainda que os peixes paralisados denunciem toda a artificialidade da operação.
Pretexto para a construção do trabalho, a imagem da água caindo ao infinito sobre os peixes foi escolhida pela artista justamente por ter sido construída para contemplação, dentro de um repertório trivial do que é “bonito” e “plácido” para ser apreciado. Mesmo que seu tema e título induzam a uma calculada melancolia contemplativa, em “Chorão” todo trabalho é empregado em função da tarefa de preencher o expediente de 504 horas que o trabalho é exibido no www.aarea.co. Sua função prática o aproxima de um screensaver (ou descanso de tela), antigo dispositivo que estampava uma imagem em movimento, elaborado para impedir que imagens paradas por muitas horas marcassem a tela.
Implementação: Caio Polesi
Fotografia: Alexandre Wahrhaftig
Agradecimento: Aquários do Brasil
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